Quando olhei para trás tive a mais
grata emoção da minha vida. Eram muitos. Eram tantos que ninguém podia dizer de
onde e como tinham aparecido ali.
Elevavam-se com tamanha facilidade no
universo imenso de minha ternura que acabamos de repente nos envolvendo numa
brincadeira que só as criaturas leves e
puras de coração podem fazê-lo. Na verdade me carregavam porque havia ainda em
mim um peso oriundo de mágoas antigas, de esperanças não resolvidas, de sonhos
a realizar.
Havia em seus semblantes tamanha
alegria que iluminava os mais secretos e escuros desvãos de minha alma.
Flutuavam. Continuavam sem parar a
dança do amanhecer nos corações há tanto tempo adormecidos.
Ah! meus pequeninos seres,.. quisera
poder compartilhar de toda a alegria que nos rodeava. Quisera poder soltar a
mais cristalina risada capaz de acordar todos os elementos. Quisera poder ouvir
as palavras que só os corações cheios de ternura podem proferir.
Entretanto, muito lentamente, alguém
que eu jamais havia visto em minha tão insignificante existência sussurrou-me
mansamente: Vem, vem comigo.
Andamos sem os pequeninos seres por
regiões que a linguagem humana jamais pôde descrever. Os pequeninos seres agora
já não me acompanhavam .
De certo modo senti-me terrivelmente
só. Era, entretanto, uma solidão misturada com espanto, curiosidade, desejo de
algo novo que pudesse acontecer.
Vem – dizia-me a criatura. Vem, vou
mostrar-te de onde vieram estes pequeninos seres.
Caminhei então mais firme. Dobrei
inúmeras esquinas. Cada uma tinha um nome: a esquina da dúvida, a esquina do
ceticismo, a esquina da mentira, a esquina do egoísmo, tantas, tantas que meus
pés já não conseguiam vencer a distância.
À medida que ia dobrando essas
esquinas, meu coração ia se modificando. Fui esquecendo mágoas, angústias,
pesares e tantos males que nos sepultam dia a dia. Abriu-se aos poucos dentro
de mim uma janela dourada. Espiei. Vi, surpresa, lá dentro, confortavelmente
sentada numa almofada de sonho, uma linda criança, a criança que eu havia sido
um dia quando tantas circunstâncias negativas ainda não me haviam escravizado.
-Olha – disse a criatura que me acompanhava – os pequeninos seres vêm
deste lugar abençoado onde o sonho derruba a mais terrível realidade. Sonha , liberta-te e verás quantos
pequeninos seres pulando e dançando à tua frente, feitos candeias a iluminar os
teus dias cinzentos.
De repente, fiquei sozinha. Havia no ar
alguma coisa misteriosa como nos dias em que
a flor mais esperada desabrocha, como nas noites em que a lua beija o
barco abandonado na praia.
Uma paz indescritível caiu sobre meu
velho coração.
Adormeci tranquila porque a antiga
criança, muito, mas muito antiga, havia despertado para sempre dentro de mim.
REGINA, MUITO OBRIGADA PELA FADINHA. É BEM DO MEU JEITO....
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