sábado, 9 de agosto de 2014

O PERIGO DOS RÓTULOS - Por Regina Pompeu


 
No meu tempo de faculdade, o pior xingamento que se poderia dirigir  a alguém era chamá-lo de reacionário (“reaça”). Era assim que os donos da verdade de plantão classificavam quem tinha a audácia de pensar de forma divergente. Hoje em dia, apareceram os adjetivos “coxinha” e “elite branca”, com o mesmo propósito.
Segundo Piaget, a classificação consiste em distinguir as características dos objetos e agrupá-los de acordo com essas características. Um mesmo objeto pode pertencer simultaneamente a várias classes: redondo, amarelo, fino, etc.. É assim que podemos organizar o mundo, a biologia, a medicina, etc..
Quando colocamos um rótulo, reduzimos a pessoa em questão a apenas uma de suas características, ignorando as demais: negro (cor da pele), corintiano (clube do coração), loira (cor do cabelo sinônimo de burra), crente (religião), etc.. A classificação que leva em conta apenas uma característica está na raiz do preconceito: a pessoa é julgada por apenas um aspecto e enquadrada num modelo predeterminado, por isso “pré-conceito”.
Agora, tomarei a liberdade de falar um pouco de mim:
Meu nariz revela a ascendência negra. Minha pele é branca, como a de meus ancestrais europeus (portugueses e italianos), imigrantes que vieram em busca de um futuro e por ele trabalharam de sol a sol. Meu cabelo escuro, farto e liso lembra o de minha bisavó índia. Meus olhos têm a cor indefinida (entre o verde, o castanho e o mel) da miscigenação das várias gerações. Um dos sobrenomes revela a longínqua origem judaica. Meu filho tem também sangue alemão. Tenho dois irmãos mestiços de japonês, frutos do segundo casamento de meu pai.
Estudei em escola pública, trabalho desde os dezessete anos, muitas vezes em dois ou mais empregos, para manter minha casa com dignidade.
Não me considero melhor ou pior que ninguém, mas pertenço a uma elite, sim: daqueles que superaram barreiras financeiras e sociais, sem qualquer cota ou privilégio especial, e tudo que tenho é fruto de muito esforço e dedicação.
A que categoria pertenço? Qual é o meu rótulo? Qual é a minha cor?
Minha história é parecida com a de centenas, milhares ou milhões de BRASILEIROS que hoje se sentem indignados por serem chamados de "elite branca" ou “coxinha” por aqueles cuja grande contribuição foi a de colocar a ética, a decência e a política em nível tão baixo como "nunca se viu antes neste país".
Que direito tem uma filósofa, branca, professora da maior universidade do país, de dizer que odeia a classe média, e ser aplaudida? A que classe ela pertence? A que classe pertence a presidentA? De que cor ela é?

Sempre fui contra rótulos em seres humanos. Rotulá-los é reduzi-los não só a uma única faceta, mas, também impedi-los de mudar de opinião, de se autoavaliar, de crescer, enfim.

É por isso que continuo concordando com Raul Seixas e me permito ser, sempre, e apesar da torcida contrária, uma METAMORFOSE AMBULANTE!


Um comentário:

  1. Rê, não vale. Eu ia comentar que prefiro ser uma metamorfose ambulante.. , muito embora alguns pontos de arrimo, sem, contudo, me dar o direito .de oscilar conforme algumas janelas vão se abrindo ,,,,

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